Um artigo recente do WSJ (7 janeiro 2012) tem um título interessante: "Avoiding innovation terrible toll". O artigo é superficial e tenta comparar as evoluções de longo prazo de empresas recorrendo a comparações ... de curto prazo, em particular da IBM versus HP, e da Apple e Google versus Kodak - na prática comparando trajetórias de alhos com bugalhos. Mas o título capta bem a ideia da "perennial gale of creative destruction" de Schumpeter e o facto de poucas empresas chegarem a centenárias. Cita dois casos emblemáticos dessa resiliência de muito longo prazo: a IBM e a J&J. E capta também a ideia da inovação como “assassina de empresas”, por mais do que um mecanismo (morto por ter cão – inovação falhada – e morto por não ter cão – falta de inovação).
Vale a pena olhar para o último
relatório e contas da IBM (2011), que celebra o exercício em que a empresa
cumpriu o seu centenário, cem anos depois, em 1911, da constituição da CRT, e
quase cem anos de Watson Sr. ter assumido, em 1914, a liderança desse
conglomerado industrial com objectivos especulativos (no mercado de capitais).
É claro que se pode contestar esta forma de medir a longevidade da empresa. A
CRT só passou a denominar-se IBM em 1924, depois de ter progressivamente
abandonado os outros negócios e se ter centrado nas máquinas tabuladoras. Será
porventura justo considerar a Tabulating Machine Corporation, fundada em 1896
por Herman Hollerith, como a empresa fundadora da atual IBM. Mas isso
corresponderia a desvalorizar o papel de Watson Sr., que sempre fez questão de
equiparar a história da IBM com a história da sua própria pessoa e família
(aliás, uma história de puro nepotismo familiar à custa dos acionistas – bem
tolerada por estes dado o magnifico fluxo de dividendos proporcionado). Nesta
construção social das fronteiras e dos limites do que é a identidade de uma
empresa como a IBM entram muitos factores pessoais e vãs (?) glórias. Watson
compreendeu que uma empresa que explorasse a tecnologia das máquinas
tabuladoras numa óptica de ferramenta de processamento de dados teria um grande
filão para explorar, e para isso o seu passado de vice presidente da NCR das
máquinas registadoras foi fundamental para o ADN da futura IBM. Holerith também
imaginou um futuro – mas antes para o seu conceito específico das máquinas que
desenvolveu e para a sua (dele) tecnologia associada, não necessariamente para
os negócios dos sistemas de informação, já para não falar na sua proverbial
falta de bom senso de gestão empresarial. A capacidade de criar comunidades
rentáveis (sustentáveis) de utilizadores era bem diferente nos dois homens.
A capa do relatório de 2011
merece uma referencia. A sua descodificação corresponde a identificar os passos
fundamentais da história dos últimos cem anos das tecnologias e sistemas de
informação através de episódios da própria IBM. Na mensagem do Chairman
Palmisano aos acionistas recorda-se a capacidade de mudança da empresa ás
mudanças no mundo, nas tecnologias e na procura pelos clientes. Mudar e ganhar
(mais) dinheiro de forma continuada e sustentável, inovação numa palavra. Por
muito conservadora que a IBM tenha sido (e foi, e até mesmo continuará a ser),
é um exemplo de inovação continuada (não permanente, mas sempre que necessário)
no seu modelo de negócio.
Cita-se:
• First, we have foreseen the opportunities of our times, and made markets in them. These have included the automation of modern retail, banking and air travel; the creation of population-scale systems such as U.S. Social Security; and the farther reaches of scientific progress, from the exploration of space to the frontiers of genomics, bioinformatics and nanotechnology. Today, it encompasses the even broader range of work we describe as building a smarter planet—optimizing the enormously complex systems that enable services
• Second,
we have created the tools to do that ambitious work and to capture its economic
opportunity. In the early decades of IBM’s life, this involved clocks, scales
and punched card tabulators. It changed fundamentally with the dawn of the
computer age, as IBM created many of its technological breakthroughs, from the
relational database to the disk drive, DRAM, FORTRAN, the mainframe, the PC and
much more.
• Finally,
we have consistently built an organization that can sustainably deliver that
kind of value. This is nontrivial. Over the past century, many enterprises,
institutions and governments have come and gone. IBM’s longevity rests on our
founders’ success in shaping a particular kind of organization. It was a
company that mastered the creation of economic value from knowledge and
information; that was truly global.
O complemento “Generating higher value at IBM” à mensagem de Palmisano inclui uma timeline da IBM no ultimo século, relativa à invenção de novas tecnologias, definição de sucessivas arquiteturas de computação e um permanente foco nas atividades de I&D, com a evolução paralela do valor das acções da empresa. Duas notas sobre isso: por um lado o fabuloso valor acrescentado criado aos seus acionistas pela empresa durante cem anos: 40 mil vezes, contra 125 do DJIA; por outro lado, a forte volatilidade (altos e baixos) ao longo do processo, sem prejuízo de uma tendência de longo prazo ascendente, mas que é especialmente visível na última década (e independente das atribulações financeiras dos mercados no final da década).
Recordo uma conversa no início
dos anos 80, em que um IBMer visionário nos dizia que a IBM tinha um futuro
assegurado porque o seu objectivo era fazer dinheiro e não os computadores.
Apesar das dificuldade em desligar da "legacy" (como os episódios do inicio da
década de 90 demonstraram), a verdade é que a IBM se tem mantido fiel a essa
ideia, e hoje em dia será mesmo muito difícil enquadrar o seu modelo de negócio
dentro do quadro tradicional dos negócios das tecnologias da informação. Ter-se-à
convertido numa multinacional de sistemas complexas e de negócios da
complexidade, com um certa verticalização de áreas críticas e um ecossistema
complementar de parceiros.
Recorda-se uma minha nota anterior sobre os
Watson e a IBM, aqui. Entretanto acrecenta-se mais um livro com alguma
relevância sobre o assunto: Kevin Maney, “The maverick and his machine”, 2003,
John Wiley & Sons.
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