Os combóios "Pendulinos" do nosso serviço Alfa resultaram dos desenvolvimentos do APT, muito em special dos mecanismos de "tilting", de forma a que a composição não precisasse de reduzir velocidade nas curvas. Se há domínio exemplar para o conceito evolutivo de inovação como "redescoberta de desenvolvimentos passado agora aplicados em novos contextos" é o dominio dos transportes. Mais de setenta anos separam as duas primeiras imagens. E vinte anos entre a segunda e a terceira.
E se fosse apenas preciso um único rail para o transporte ferroviário, em vez de dois? A ideia do monorail é antiga e persistente. Um desafio para o qual têm sido propostas muitas soluções - mas um desafio que niunca vingou como tecnologia adoptada em larga escala. O conceito foi especialmente popular nos finais do século XIX de depois na década de 50 do século XX (para uma história breve dos monorails, ver aqui e aqui; para uma introdução á evolução dessa tecnologia, ver Wikipedia).
O caso mais famoso e interessante terá sido o gyro monorail de Louis Brennan (1852-1932, Wikipedia), patenteado em 1903 e demonstrado com sucesso em 1909, no Reino Unido (primeira imagem), um sistema monorail equilibrado por um giroscópico, desenhado a pensar em aplicações militares (rapidez de implementação da linha para soluções expeditas de transporte ferroviário). Brennan tinha já feito inventos militares, sendo famosa a venda milionário que no inicio do século XX fez de uma patente sobre um sistema de defesa de portos e canais por torpedos.
Uma bicicleta é um veículo "monorail" (sem rail) equilibrado pelo giroscopio humano de cada um. Um caso clássico de conhecimento tácito (aliás muito citado por Michael Polanyi). Alguém sabe fazer um livro de instruções de como andar de bicicleta? Mas a verdade é que muitos sabem andar de bicicleta, e aprenderam a andar experimentando ("learning by use") e aperfeiçoando o processo, em especial depois de cada insucesso mais ou menos doloroso. Logo sabemos muito mais do que conseguimos dizer (explicar). Como em todos os processos de construção de conhecimento tácito (não explicito e não estruturado), vai-se conhecendo pela interiorização progressiva da experiencia ("indwelling"). Cada experiencia reorganiza o conhecimento anterior de forma irreversivel. Andar de bicicleta e conduzir um automovel foram exemplos de Polanyi que inspiraram os conceitos de "rotinas" (pessoal e organizacional) explorados por Nelson e Winter no seu famoso livro "An evolutionary theory of economic change" (Harvard University Press, 1982, ver cap. 2 (Skills), em especial secção 4.2 Skills and tacit knowing), base da chamada teoria "evolutionary economics", que muito tem influenciado o estudo dos processos de mudança e de inovação na economia, durante os ultimos trinta anos.
Voltando aos monorails: a exploração comercial do "gyro monorail" de Brennan nunca se concretizou. Chegou a estar adjudicada uma linha próximo de Moscovo, chegaram a ser lançados alguns kms de monorails, mas nunca chegou a abrir para exploração. O medo das consequencias do giroscopio (mecanico) poder falhar terão sido sempre determinantes.
Entretanto um chip com os circuitos electonicos de giroscópio custa agora 5 a 10 euros. A miniaturização da tecnologia e a sua melhoria permitem novos arranjos das soluções deste tipo. A Segway foi apresentada na altura como uma "revolução" nos meios de transporte. Sem se discutir o seu razoavel sucesso, ficou longe da anunciada revolução, e é facil encontrar muitas "raízes" anteriores para a tecnologia. Embora recorra a modernos giroscópios electrónicos, o sistema continua a ser dependente da condução por um humano - nesse sentido o sistema de Brennan era mais autonomo do operador humano. Conduzir uma Segway implica uma (curta e fácil) aprendizagem de condução, asociada à inclinação do condutor - uma vez mais uma forma de conhecer tácito por aprendizagem "fazendo".
Poderão as novas gerações de giroscopios electrónicos e a fiabilidade dos actuais sistemas permitir ressuscitar / redescobrir a tecnologia do monorail?
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